Como é difícil escolher o melhor local, posição, enquadramento ou ângulo para obter-se uma boa fotografia. A imagem captada pode ter um sentido medíocre ou fabuloso, dependendo apenas do local de onde a lente capta a imagem, as regras sempre a favor da luz, às vezes, não são a melhor opção. O melhor local pensado por vezes não pode ser alcançado, há barreiras, há obstáculos, simplesmente não pode-se estar na posição ideal.
Como então encontrar um modo de obter o melhor da imagem que projetamos, se os elementos não nos permitem tal ousadia? em paisagem não é possível arrumar as coisas a nosso gosto, é preciso ver o melhor sem mexer em nada. A única coisa que iremos moldar é nossa escolha, tudo mais é fixo, tudo mais está onde deve estar, existe magnificamente daquela forma, e não podemos usar a força de nosso ímpeto para modificar.
Quando insatisfeitos resolvemos mexer na natureza de modo a ficar mais a nosso gosto, sempre ferimos os elementos. Quebrar uns galhos, mover umas pedras, retirar algo que bloqueia a entrada da luz, não traz maior beleza, mas sim uma paisagem agredida, falsa em sua existência e nosso interior a rejeita. O ângulo ideal parece estar acima do chão, se pudéssemos voar um pouquinho, talvez alcançaríamos o quadro desejado, cincados, obtusos, não temos este dom. Nem por um breve momento!
Estar em um local de beleza ímpar, mas como interceptar todas as coisas estando em apenas um lugar? Não é possível, mas podemos incluir mais alguns valores, aumentar nossa satisfação somando mais coisas, agregando mais beleza a nossa presença, complementando a imagem que vemos.
Será? As leis da física nos dizem ao contrário, pois dois corpos não ocupam o mesmo lugar no espaço, mas estas leis como regras, também não são tão certas, isto só vale para sólidos, os gases desafiam a rigidez da regra, mostrando que sempre há mais a saber.
Mas não fazer nada, não é uma opção, pude incluir belas formas no céu e adicionar mais cores e contrastes, até mesmo na projeção das sombras. As sombras não são mais opacas, e sim translúcidas, e permitem ver mais tons de cores, mais vida.
Claro perdi um pontinho vermelho e as folhas das árvores, mas ganhei tanto, que de certo não me fará falta. Quem precisa disso? Que valor pode ter isso? Não tinha mesmo muita serventia!
Somando coisas não percebemos a matemática da vida, para cada adição sempre haverá uma subtração, não é possível integralizar tudo, só não sabemos se nossas escolhas nos levam para o melhor, para frente, pois não temos muito hábito de olhar para todos os lados, nosso julgamento costuma ser egoísta e voltado sempre para o nosso melhor.
Na natureza é possível compartilhar, é possível contornar o caminho sem remover o que já existe, abrir passagem para a contemplação da beleza com menos agressão. Nada irá ficar parado, a passagem exige uma adaptação dos elementos, as matas vêem as mudanças como novas oportunidades, e crescem sobre os caminhos de pedras, por mais áridos que possam ser.
Não acredito ser possível encontrar uma posição para capturar uma imagem melhor, pois o simples fato de mover à volta da imagem é complicado, é escorregadio, é perigoso, pois pode estragar algo que nos é egrégio.
Prostrado fiquei com o que podia obter, nem mesmo tentei passar pelo caminho e obter outra imagem pelo outro lado, o que tinha já me valia, em segundos tomei a decisão de um click, e seguir em frente. Como são raros os momentos que tomamos decisões de subtrair, sem olhar para trás, sem calcular as perdas, doar sem prejuízo, inverter a matemática e tirar de si. Sentir que esta ganhando mais que o que deixou para trás.
Como é difícil a tal felicidade, nunca estamos contentes com o que conseguimos. Para captar esta imagem desci um penhasco rochoso e como pode ver coberto de limo e folhas, estava tão confiante, que encarei o desafio de pé, logo nos primeiros passos escorreguei e por sorte consegui me equilibrar. Caso tivesse caído era só rocha a frente e uns 10 metros de desnível até chegar ao fim, ou seja, seria um dia daqueles, de muita dor e sofrimento.
Então engoli o orgulho e fui rastejando, sujando as roupas, mas evitando o tombo, parece que todos cedo ou tarde tem de aprender esta lição, não é a posição e sim o caminho que escolhe para alcançar o sucesso. Sucesso? Nem tanto, ainda só tinha o brilho do sol em poucos locais queria mais cores e brilho.
Me arisquei um pouco mais, pois meus olhos viam mais cores que a fotografia não podia captar. Precisava me aproximar mais das rubras pedras afim de obter toda sua coloração.
Continuava rastejando e escorregando já que o local não era para ser tão intensamente devassado, uma mistura de medo e coragem, aventura e temor, acho que deve ser a tal adrenalina.
Vários clicks e consegui cores brilhantes, tão belas quanto as via, mas a bela vegetação que pairava não pode ser captada, tentei levantar, mas no meio do caminho vi que era melhor ficar sem esta foto do que ficar quebrado.
Tirei a foto até onde deu para equilibrar-se, só para lembrar do caminho, não teve toda a beleza das cores que um excelente ajuste podia dar, mas mostrou que em tudo precisa haver limites.
Esta é a segunda vez que fotografo este local, mas as pessoas insistem em depredá-lo com velas e outros objetos escusos, devem ter uma finalidade que minha compreensão não permite alcançar.
Sempre que cercear a vida de alguma forma terá um pesar, mas como construir sobre o que já existe sem eliminar o que havia, o engenho está em construir, alguns pensam em compensar de alguma forma, alguns pensam em concretar tudo e depois recompor alguns poucos lugares, um verdinho aqui outro lá e temos um ambiente ideal. Não podemos crescer sem matar, sem consumir, sem mudar tudo. Podemos é minimizar nosso impacto.
A velocidade do mundo pode impedir nossas decisões mais bem pensadas, como neste caso, a bordo de um trem a velocidade de 40km/h não foi possível ajustar o ângulo ou mesmo tirar uma segunda fotografia de tão belo local e esplêndida luz. Não podia parar a máquina para dizer que aquilo que via era muito importante para mim, mesmo que não importasse tanto aos outros. Nosso julgamento por muitas vezes está mais voltado ao que os outros vão pensarem, como os fatos serão entendidos e menos voltados ao que nosso coração dizer ser o melhor a ser feito.
Perdi a bela luz daquele local maravilhoso e normalmente não há repetição ou outra chance de captar o melhor de cada cena, o melhor que pode ser feito.
O enquadramento que fazemos na fotografia e na vida não tem valor apenas para nosso ego, mas também para nossa estória, para nosso interior. Não se traz nada para a vida além da alma, e nada se leva quando partimos, mesmo assim construímos para deixar nossa marca de passagem, como recompensa, talvez um dia alguém tenha uma breve lembrança de que por aqui estivemos vendo algo que deixamos. Quantos arco-íris cada um vê, em cada imagem, depende mais do nosso conteúdo que de nossa acuidade visual.
Que as lembranças deixadas sejam marcas de nossa beleza interior, pois tudo mais fenece.